I Seminário Shelida Ayana: Cotas na Graduação e Pós-Graduação
- Laboratório GE-SER

- 11 de ago. de 2018
- 4 min de leitura
Por: Sara Wagner York
Falar sobre a diversidade não é uma tarefa fácil, pois exige uma compreensão do que é a verdadeira democracia, respeitando o tempo e o espaço do/a outro/a. No Brasil, por exemplo, onde as desigualdades disparates irracionais incoerentes, a questão da diferença abre uma fenda nos discursos totalizadores, tanto na esfera política quanto educacional, principalmente no que tange à reflexão sobre uma “Pedagogia da Diversidade e da Diferença” , que deveria nortear as ações coletivas na tríade do que nos ensina Michel Foucault (2000) quanto às questões de saber-poder, conhecimento versus verdade, tendo em vista a problematização de muitos aspectos engendrados no espaço educacional-escolar-formal. Neste Seminário, conversamos de modo lato sensu, sobre o tema e este texto dialoga com a fala inicial, trazida pela filosofa, Leila Dumaresq e participantes naquele momento.
Quando falamos de políticas afirmativas trans, muitas de nossas ações tem sido apreendidas com movimento feminista e feminista-negro, onde mais seria? Nas comissões de avaliação por cotas, desde a formação da banca à permanência deste grupo nos espaços escolares, devem ser pensados, diz Maiara Fafini. Tencionar questões trans/cis na educação, tornou se uma demanda ampla: Acesso à educação básica com extensão aos bens intelectuais, culturais da sociedade e também acesso aos estudos que garantem o ingresso nas profissões liberais e tidas como de maior prestígio. Ao pensarmos em pessoa trans, um dos primeiros pontos que emerge é se de fato, atualmente esta pessoa vivencia "as dores e alegrias" de ser o que tem reivindicado, como trazido por Jaqueline Gomes de Jesus. É possível que pessoas não trans acessem tais políticas, assim como o é, nas questões das cotas raciais? Entretanto, quem pode chancelar uma auto-identificação? Essa demanda irmana o movimento trans nesta pauta com a maioria dos brasileiros excluídos pelo acesso aos aparatos sociais que entesouram estes bens, universidades inclusas entre eles. Estabelecendo a políticas de cotas, teríamos pessoas trans para preenche-las? Como pontuado por Giowanna Cambrone. O próprio pensar a diferenciação trans-cis, é uma discussão bem recente, estima se que o termo esteja presente nos últimos cinco anos, o que nos mostra o quanto estaríamos longe de outras inserções, mas ao mesmo tempo, tão próximos delas. Os saberes e vivências trans, contribuíram de modo potente à produção hoje existente sobre questões de poder, gênero e sexualidades. Produzimos ou participamos da produção direta ou indiretamente. Reivindicar inserção em todos os espaços não deveria ser pensada como, acolhimento, mas reação espontânea sobre a percepção de próprias privilégios ao rever as mazelas a nós atribuídas ao longo da história.
Muitas de nós, trans, não brancas, sem passabilidade, sem apoio familiar, sem grupos sociais de apoio, imigrantes e ainda tendo como única fonte de renda, a prostituição. Cidadãs de direitos e não de fato, nos adverte, Wescla Vasconcelos. Buscando reparações históricas e sociais, em função dos processos de exclusão, nos lembra Leonardo Peçanha.
Porém, o debate institucional é específico: Temos que discutir o acesso em cada nó de decisão na instituição. Não será em uma grande assembleia universitária que começaremos a mudança, mas uma assembleia, um trabalho trans, um ponto assistido já traz à tona o olhar hegemônico para tal re-des-construção. Muitas vezes, perderemos a votação das demandas nas assembleias e espaços e construções (a menos que estejamos falando de uma universidade muito específica). A presença trans em muitos lugares ainda é lida como uma ameaça, ressalta, Indianare Sophia. Então temos que brigar por isso primeiro em cada departamento, depois em cada faculdade e assim progressivamente. É um trabalho duro, de longo prazo. Um trabalho acadêmico como este tem bastante impacto levantando o debate institucional, que apesar de só resvalar na grande pauta política, tem a função de consolidar o debate nas unidades da universidade e discutir argumentos específicos para que corpos outros produzam epistemologias, segundo Amiel Vieira. Sejam implementando localmente e na construção de massa crítica de apoiadores de políticas afirmativas ou validando falas outras, que foram ignoradas pelos e nos processos de construção hegemônica. Bruna Benevides pontua sabiamente, que muitos doutores não sobreviveriam às nossas lutas, mas nós somos todas, Doutoras e Doutores, na vida!
É neste escopo da política institucional, na mudança de uma única universidade, algumas vezes de um único campus, que adquire mais relevância o debate sobre cotas na Pós-Graduação sem ao menos tê-las na Graduação. Não são todas as pessoas trans que querem e pesquisam suas próprias produções, suas sexualidades e gêneros. Queremos e precisamos ir além, afirma, Giowanna Cambrone. É uma medida com pouco impacto direto no acesso e permanência da população trans na universidade, mas é uma tomada de posição do departamento que assume esta política como sua, a favor de políticas afirmativas na comunidade acadêmica. O coordenador do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas em Direitos Humanos, Prof. Dr. Vantuil Pereira, nos chama a atenção, que se o movimento social se aquece nas bases, nada mais habilidoso, que instrumentalizar professores-Mestres e Doutores, para que de cima para baixo a ação também possa ser potencializada. São os nossos furos nos muros, fazendo seus primeiros efeitos.
Sabemos das limitações do debate, mas acreditamos na construção à longo prazo que possam culminar em políticas afirmativas específicas para a população trans em toda a universidade. O encontro com parceiros, aliados e/ou cis-aliados nos departamentos tem levantado o debate institucional nos levando a acreditar que outros departamentos possam aderir individualmente ou coletivamente, para que tenhamos no final, uma votação vitoriosa nos conselhos universitários. O destino de corpos trans, seguem sendo decididos por pessoas cis.
Um trabalho como este não exclui outros trabalhos políticos que possam resultar em uma lei ou política nacional que obrigue universidades federais e estaduais a implementar políticas afirmativas atendendo todo território nacional. Porém, a experiência com os decretos de cotas do Governo Dilma Rousseff, com o SUS e também com a recente implementação do direito ao registro civil, mostram que esse tipo de medida geralmente produz implementações capengas de direitos garantidos. O que mostra a importância do debate institucional local. Sendo que o decreto de cima para baixo apenas dispara o processo de acesso de fato ao direito para as bases dos movimentos sociais. Espaços onde pessoas trans possam circular e estar em segurança e em função de espelhamento, para mais que “sermos umas poucas”, seremos tão presentes quanto outros corpos autorizados, finaliza, Céu Cavalcante.
Assino, Sara Wagner York,
em nome da comissão organizadora deste evento.
Shelida Ayana, presente!
Matheuza Passareli, presente!








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